quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Africa Minha… 2ª parte


Cheguei a Angola!
Após cerca de 7 ansiosas horas, sentada numa cadeira de avião, a jogar sudoku intercalando com algumas respostas a emails, sonecas interrompidas por risos e choros de bebés, e de algumas idas à WC, finalmente avistei Africa!
O sentimento era misto, por um lado sentia-me ansiosa por relembrar todos as emoções agudas que senti da primeira vez que cá estive, por outro senti-me sozinha num mundo novo e inóspito, tão diferente da Europa.

Chegada ao aeroporto, fiz de tudo para seguir as recomendações do meu Popey, fui a última a entrar na carrinha de interligação avião-aeroporto, fui a 1ª a sair da mesma, a 1ª a entrar na fila para dar entrada no país, e fui das primeiras a sair com a bagagem que entretanto já me esperava no tapete rolante.
Incrivelmente tudo parecia ocorrer de forma escorreita. África estava a facilitar-me a vida. Com 30 anos e atenta a todos os movimentos, desta vez África aceita-me como adulta e presenteia-me com sorrisos e amabilidade de boas-vindas por parte de todos aqueles que cruzaram o meu caminho no aeroporto.
Depois de alguns minutos de espera, o condutor Sr. D apareceu e levou-me à casa do Bairro Azul onde fiquei uma noite.
Tive oportunidade de ver um pouco da noite de Luanda, para mim ainda assustadora, escura, pobre e desarranjada. Esta sim a verdadeira Luanda. O sentimento de insegurança invadia-me o pensamento a cada passada, a cada olhar nervoso em torno do ambiente. “Onde está o carro? Onde está o carro?” – só me iria sentir segura quando ouvisse o catching da tranca do carro…e assim foi. Só já dentro do carro, depois de atirar as malas de forma atrapalhada e nervosa, é que relaxei e senti os músculos do corpo a latejarem discretamente.

Claro que passei também pela falsa Luanda, a cidade mágica e de excelência, onde os ricos são realmente ricos e os carros competem pelas polegadas das suas jantes…é um mundo de Bling…um mundo brilhante onde o dólar vence tudo. Fui jantar a um dos vários condomínios privados, rigorosamente guardados por militares…senti-me segura.

O cheiro africano estranhei a ausência.
Estava à espera de o sentir assim que chegasse ao aeroporto de Luanda, mas na realidade só o senti no dia depois quando cheguei ao Lobito, a minha casa durante 3 semanas de formação.

A selva ainda continua selva, verde como não há igual. As crianças ainda brincam descalças e empoeiradas, riem…riem. Tranquilizo-me ao ver felicidade entre as paredes da pobreza. Ficamos cheios!
Chego a um palácio divinal, uma mini mansão de 3 andares, completa por janelas de vidro de alto a baixo e espelhadas que nos trazem luz mas reflectem privacidade. Uma sala acolhedora com espaços amplos dá-me as boas-vindas e direcciona-me para o 2º andar para um dos 3 quartos. Escolhi um dos que tem vista para a baía, e a partir do qual desfruto do nascer do sol, rosa alaranjado. Um quarto simples que não deixa faltar nada essencial, nem mesmo o AC para controlar os imperiosos mosquitos. Afinal esta pode ser a sua terra mas aquele espaço é meu por direito durante 20 dias. “Aqui quem manda sou eu e o meu AC, mosquitada podem fazer as malas e sair.”

No domingo, acordei para o meu 1º dia de Lobito…rodeada de mar à frente e atrás, senti o chamamento e após o almoço tive de ir espreitar a praia da restinga. Praticamente vazia e praticamente virgem, fez-me lembrar as praias escondidas do Algarve, onde a areia é crua e o mar nos invade. Suspirei de paz, senti-me a relaxar. O sol morno marcava as 15horas.
Um dia calmo onde o cheiro a maresia africana tomou conta de mim e até hoje me empresta um pouco da paz angolana. Estou bem.

A par do desenvolvimento de infra-estruturas, dou-me conta de maior civismo, mais silêncio, mais cumplicidade entre as pessoas. Algo mudou…
Sinto como que uma cultura pré-europeia a querer contaminar as raízes pouco sociais de África…será a evolução comum da sociedade? Parece-me que sim.
Com direito a um por-do-sol laranja espectacular, senti-me abençoada por ter mais esta oportunidade de dar formação a quem precisa, ajudar quem quer ser ajudado, dar a minha contribuição e ainda por cima, ser paga para isso…muito bom! É isto que quero levar da vida, experiências de auto e hetero-conhecimento e ajuda, de aprendizagem e de formação humana…muito bom!

Os dias têm corrido bem, não tenho possibilidade de fazer muita coisa, além de trabalhar e de enganar a saudade da família com recurso ao skype e a conversas longas com o popey. A família está bem é o que realmente importa.
Os formandos riem com a formação, aprendem, absorvem, tenho o meu reconhecimento todos os dias, sinto-me feliz!

Ontem depois da formação fui à praia, completamente deserta, embora central. Mergulhei num oceano vazio de pessoas e contemplei um sol que parecia querer tocar a água tornando-a quente. Foi muito bom, seria tão bom se pudesse terminar o dia sempre assim.


Amanhã será o último dia da 1ª semana de formação, amanhã saberei o que os meus formandos pensam da formação.

7 comentários:

César disse...

Procuro acompanhar as tuas crónicas de viagem e, por elas, saborear os relatos paisagísticos, laborais e humanos nos quais pois toda a tua sensibilidade e saber. O nosso desejo é que realizes o teu trabalho com espírito de missão e que te revejas nele com sucesso.Beijos.

PoPey disse...

Como sempre MUITO BOM!

De prosa fácil e escorreita, imagino-te a dedilhares vertiginosamente no teu teclado tentando acompanhares o brotar dos pensamentos com que nos brindas! É uma dádiva e um previlégio poder partilhar a minha vida contigo. Um dia estaremos juntos a mergulhar na África profunda, a África dos meus sonhos! Beijo GRANDE e boa sorte para essa pequena (curta) GRANDE missão!! Cá te esperamos, como sempre de braços abertos!!

marguinha disse...

Mais uma oportunidade para sentir/saboreares África!
Renovo o sentimento de orgulho pela minha frágil heroína que como o expectável cumprirá com sucesso mais este desafio.
Miljinhos

MrsCreativity disse...

só gente boa a falar...orgulho tenho eu de vocês os três

CC disse...

Ao ler as tuas palavras sinto um misto de sentimentos que vão desde o medo por estares sozinha, tão longe da tua família, à alegria de te imaginar feliz pela experiência que está a viver, e a qual saboreas ao mínimo detalhe. Admiro-te a coragem, o espírito aventureiro e lutador. Beijinhos grandes e até já.

MrsCreativity disse...

eu também sinto um misto de sentimentos, sinto uma saudade incrível da Lara, já desidratei à conta das saudades. por outro lado quero fazer a minha vida aqui, quero ser feliz aqui, ganhar bom dinheiro e praticar o bem. Estou a fazer o possivel para ficar por aqui e trazer a familia

Anónimo disse...

Viajar pelos seus olhos, neste blog, é um deleite.

Há demasiado tempo que não nos brindava com um novo relato resumido, simples e sentido (apesar desta vez, ser tão marcadamente nostálgico).

Após reler 3 anos mais tarde Africa I, não posso deixar de lhe pedir que após este prólogo, nos delicie uma vez mais com as suas descritivas experiências.

Queremos ver, queremos sentir, queremos ouvir, e tarda demasiado em escrever.


Escreva e faça-nos viajar pelos seus olhos!...